Operação Popeye: quando o clima era usado como arma de guerra – Artigo

Na Guerra do Vietnã, pela primeira vez, as forças militares modificaram o ambiente climático para fins hostis. Quando essa tática se tornou conhecida, a humanidade concordou em proibir a manipulação do meio ambiente como uma arma.

Um tanque preso na lama, na estação das monções durante a Guerra do Vietnã.

A participação dos Estados Unidos no conflito do Vietnã começou com pouco menos de 1.000 homens no início da década de 1960. Em 1967, o número havia crescido para quase meio milhão de soldados. O esforço dos EUA para deter o avanço do comunismo exigia uma grande quantidade de recursos econômicos e humanos sem obter vantagens militares claras, e as primeiras vozes contra a intervenção no conflito começavam a se levantar.

Havia chegado o momento de usar, no maior sigilo, uma arma não convencional e controversa.

 

O ‘Ho Chi Minh’

A tudo isso, a logística das forças comunistas era imparável. O ‘Ho Chi Minh’ era um conjunto de trilhas e estradas de 16.000 km de extensão total, controlada pela República Democrática do Vietnã (Vietnã do Norte, comunista). Atravessava o território do Laos e do Camboja, chegando à República do Vietnã (Vietnã do Sul), por onde transitaram combatentes, armas e material de guerra destinados à resistência comunista. Para os norte-americanos era prioritário cortar essa cadeia logística para vencer a guerra.

O 'Ho Chi Minh' era um conjunto de 16.000 km de trilhas e estradas que facilitavam a logística e o movimento de tropas para os comunistas.

As táticas e estratégias militares usadas pelas forças dos EUA não estavam funcionando. Chegara a hora de olhar para o céu, mas não exatamente em busca de ajuda divina.

Semear nuvens e receber chuvas

Em 13 de novembro de 1946, Irving Langmuir experimentou uma alegria semelhante ao dia em que soube que havia ganhado o Prêmio Nobel de Física. Enquanto estava no aeroporto de Schenectady, Nova York, ele assistia ao voo de um pequeno avião do qual seu assistente, a uma altitude de cerca de 4.000 m, estava jogando grânulos de gelo seco em uma nuvem. Depois de alguns segundos, a nuvem começou a se dissipar, transformando-se em chuva. A alegria de Langmuir era natural: ele havia encontrado uma maneira de controlar o clima.

A semeadura de nuvens pode ser feita a partir do solo ou do ar, mas não há um consenso firme sobre sua eficácia como método.

A modificação artificial do clima começou a ser desenvolvida para gerar precipitação em pequena escala e também foi experimentada para enfraquecer os ciclones tropicais.

Em 1947, o Projeto Cirrus, financiado pelo governo dos Estados Unidos, foi posto à prova. Tentativas foram feitas para enfraquecer os furacões semeando suas nuvens com gelo seco, mas os resultados foram desastrosos em termos de danos, e as ameaças de ações legais contra o governo prosperaram. Rapidamente o Projeto Cirrus foi deixado de lado.

Em 1962, os avanços da ciência permitiram reviver a ideia de enfraquecimento dos furacões. Nessa ocasião, a semeadura das nuvens de um furacão não seria mais com gelo seco, mas com iodeto de prata, o que mudaria sua estrutura interna. O projeto tinha o nome de Projeto Stormfury.

O Projeto Popeye

As chuvas poderiam ajudar as forças dos EUA a interromper as operações de logística em ‘Ho Chi Minh’. Nesse sentido, foi desenvolvido um programa ultra-secreto de modificação artificial do clima através da semeadura de nuvens para induzir a precipitação, a fim de estender a estação das monções sobre a área de Ho Chi Minh.

Em um memorando ao Secretário de Estado, foi relatado que durante a fase de teste do Projeto Popeye (Laos, 1966), 82% das nuvens semeadas produziram chuva em níveis acima do normal. O relatório afirmou que os cientistas do Departamento de Defesa dos EUA acreditam que o experimento demonstrou a “capacidade de aumentar e manter as chuvas sob condições controladas até o nível em que a terra fica saturada por um período sustentado, retardando o movimento a pé e inviabilizando a operação de veículos”.

O Projeto Popeye cresceu de um experimento para um programa operacional do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, chamado Operação Popeye. As operações militares foram realizadas pelo 54º Esquadrão de Reconhecimento Meteorológico, responsável pela semeadura de nuvens com iodeto de prata e iodeto de chumbo entre 1967 e 1972 sobre Laos, Vietnã e Camboja. Embora a operação da cadeia logística de Ho Chi Minh tenha sido retardada pela extensão do período de monções em aproximadamente 30 a 45 dias, ela continuou a funcionar, de modo que o sucesso militar foi relativo.

Divulgação pública e escândalos

Entre 1971 e 1972, vários artigos foram publicados denunciando que a modificação artificial do clima estava sendo usada como arma no Vietnã.

O Senado pediu relatórios ao Pentágono, que atrasou sua entrega para depois argumentar que não havia consequências ambientais negativas e que a Operação Popeye havia sido responsável por um aumento nas chuvas de apenas 5%.

escândalo público fez cessar a Operação Popeye em 1972, à qual se acrescentou a resolução do Senado de 1973, proibindo “o uso militar de qualquer técnica de modificação ambiental ou geofísica”.

Composição: um WC-130 com o dispositivo ejetor de iodeto de prata usado no Vietnã para semeadura de nuvens e um recorte do New York Times denunciando esta operação da CIA.

A modificação artificial do ambiente para fins militares ou outros fins hostis foi objeto de discussões iniciadas na Conferência de Estocolmo em 1972. Na Declaração, foi acordado que as nações tinham a obrigação de garantir que suas atividades não prejudicassem o meio ambiente de outras nações.

Tratados internacionais: apenas para usos pacíficos

Em 1974, o presidente dos EUA, Richard Nixon, e o secretário-geral da URSS, Leonid Brézhnev, concordaram em entrar em negociações bilaterais para superar o perigo da utilização de técnicas de manipulação do meio ambiente para fins militares.

Em 1976, as Nações Unidas realizaram a Convenção sobre a Proibição do Uso de Técnicas de Modificação Ambiental para Fins Militares ou Outros Fins Hostis (ENMOD), um tratado que compromete as mais de 70 nações que aderiram a não usar técnicas de modificação ambiental com fins militares ou outros fins hostis. Dentre elas, estão incluídas todas aquelas que “se destinam a alterar – através da manipulação deliberada de processos naturais – a dinâmica, composição ou estrutura da Terra, incluindo sua biótica, sua litosfera, sua hidrosfera e sua atmosfera, ou do espaço exterior”.

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Esta Convenção não impede o uso de técnicas de modificação ambiental para fins pacíficos, que de fato são utilizadas em mais de 50 países do mundo, em alguns para combater a seca, como Estados Unidos, China, Índia e Rússia, entre outros; enquanto na Argentina, Espanha, França, Itália, Bulgária e outros, são usadas para a supressão de granizo.

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